Por Mauricio
de Oliveira Filho e Nayara Moreira Gatti
Estudantes
de Serviço Social da Unifesp Baixada Santista
Uma das bandeiras históricas do Movimento Estudantil é a defesa de investimento de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) na educação pública de forma imediata. O entendimento do Movimento é que a defesa da educação pública, não passa de demagogia se não se propõe aumento substancial do investimento público em educação pública. Diversas ações já foram feitas por entidades, coletivos e militantes do Movimento Estudantil no sentido de publicizar e pressionar o(s) governos(s) a aprovar o investimento de “10% do PIB na educação pública já”, como o Plebiscito Popular de 2011, construído por DCE’s e Centros Acadêmicos de diversas universidades, CSP-Conlutas, MTST e MST e ANDES-SN, o qual resultou a aprovação de 99% dos 420 mil cidadãos que participaram.
Neste
ano, a Câmara dos Deputados aprovou a meta de 10% do PIB para a educação no
novo PNE (Plano Nacional de Ensino), válido de 2013 a 2023 – o texto deve ainda ser
aprovado pelo Senado e sancionado pela Presidência. Governo e direção
majoritária na UNE (União Nacional dos Estudantes) comemoram a “conquista
histórica”. Mas é necessário que se desmonte a falácia: o que foi aprovado não
contempla em nada a nossa reivindicação, pois além de ser apenas uma meta – não
há nenhuma punição prevista em caso de descumprimento – e só estar prevista
para ser atingida no fim do período (2023), não há a garantia de que esse
investimento será feito na educação pública, continuando a farra de repasses de
dinheiro público para empresários da educação privada manterem seus negócios
via ProUni e Fies. Este mês, inclusive, tiveram suas dívidas perdoadas em troca
de bolsas de estudo. É o governo federal fazendo escambo com o mercado de
diplomas.
Vale
dizer,ainda, que no antigo PNE, válido de 2000 a 2010, a meta de investimento era de 7% do PIB no fim do período, porém, este valor nunca fora cumprido e o percentual investido hoje, varia entre cerca de 4% e 5%. Tanto o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso – 1995/2002 pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) –, quanto Luiz Inácio Lula da Silva – 2003/2010 pelo Partido dos Trabalhadores – chegaram a vetar o percentual de investimento, o que mostra uma semelhança entre ambos programas: defesa da educação de forma vazia e demagógica.
Os fatos se tornam ainda mais revoltantes quando olhamos para os dados de execução orçamentária de
2011 e constatamos como foi repartido o orçamento da União, destinando praticamente a metade do orçamento para o pagamento de juros e amortização da dívida pública, ou seja, metade do orçamento da União foi direto para a mão de credores (destes, 98% são bancos, fundos de pensão e/ou fundos
de investimento), na medida em que para a educação são destinados míseros 2,99%.
Só até maio deste ano, já foi gasto
mais com a amortização da dívida pública do que a previsão de investimentos
para todo o ano em educação.
Desculpa esfarrapada
Atualmente tem-se tornado comum por parte dos responsáveis pela administração da educação pública o discurso de que recurso financeiro não é um problema que enfrentam; o que não condiz com a precarização dos ensinos básico, fundamental, médio e superior. Sem obter sucesso em absolver a culpa dos governos, os gestores das instituições indicam a burocracia como a principal dificuldade para desenvolverem suas obrigações.
Entretanto, temos que ressaltar alguns pontos que não estão considerados neste discurso:
ñ O destino e, neste caso, sobretudo, a origem dos investimentos não devem ter outra via que não a pública, para que então o Brasil possa ter um ensino socialmente referenciado, isto é, um ensino que garanta o retorno da produção de conhecimento para a sociedade;
ñ O parecer de satisfação diante do montante a ser investido se baseia em condições reais estritamente limitadas, como a política de permanência estudantil do ensino superior que não contempla a totalidade dos estudantes que necessitam deste direito para concluir os estudos e a não condizente remuneração dos profissionais de educação em instituições públicas e privadas.
A permanência
estudantil é também um problema no ensino fundamental: de cada 100 crianças matriculadas na 1ª série do ensino fundamental, apenas 51 o completam; 33 completam o ensino médio e apenas 11 completam o ensino superior. E mesmo aqueles que completam, sofrem
com a falta de qualidade das escolas públicas. O analfabetismo atinge cerca de 10% da população brasileira acima de 15 anos de idade, ou seja, mais de 14 milhões de analfabetos em nosso país.
A Unifesp como exemplo
Cumprindo a cartilha aparentemente seguida pelos demais gestores das
universidades federais, o reitor da Unifesp Walter M. Albertoni, em entrevista
ao Jornal da cultura, no dia 22/06/2012, disse: “Não tenho problemas com
verba”. Indagado se o problema era então de gestão, responde: “Não. O Problema
é você conseguir aprovar uma licitação”, indicando que o problema seria a
burocracia do Estado. Dessa forma, confirmados os fatos, toda a luta histórica
do movimento estudantil por mais investimentos na Educação pública, como a
defesa dos “10% do PIB para a Educação Pública Já!”, estaria deslegitimada e
mais, estaria mirando no problema errado.
Contudo, não são afirmações vazias que vão derrubar uma bandeira
histórica do Movimento Estudantil, construída de forma sólida e não de modo
raso, como essa agitação burocrática. Assim, vamos entender com o exemplo da
própria Unifesp o porquê desta reivindicação e porque estudantes de diferentes
gerações lutam por ela.
Num dos documentos mais importantes da expansão da Unifesp, o PDI (Plano
de Desenvolvimento Institucional), que pretende ser norte da Unifesp no período
de 2010 a 2015, existe uma única página (meia, na verdade) sobre recursos
financeiros. Esta meia página acaba com a seguinte frase: “A captação de
recursos em fontes não-governamentais nos próximos anos será fundamental para a
manutenção da Universidade e a continuidade de seu padrão de excelência.”. Ora,
já aqui encontramos uma imensa contradição no discurso oficial da Unifesp. De
um lado o seu reitor diz que não falta verba para a universidade, de outro um
documento oficial da instituição diz que se não buscar verbas de fontes
privadas, a universidade não poderá manter seu “padrão de excelência” (aliás,
também cabe perguntar a que padrão de excelência o texto de refere).
Em outros dois documentos, os relatórios de gestão 2004 e 2011 (a
prestação de contas da Unifesp), encontramos dados que apenas reforçam o
declínio do investimento na educação no período e o processo de precarização da
Unifesp. Em 2004, a Unifesp contava com 1293 estudantes de graduação. Já em
2011, com 7166. Isso corresponde a um crescimento de 454,2%. Os campi passaram
de 1 para 6, ou 500% de aumento. Os cursos de graduação aumentaram em 1020%, de
5 para 56. Contudo, os gastos correntes passaram de R$ 462.713.203,30 para
R$740.793.360,00, o que significa um
aumento de 60%, mas se descontarmos a inflação acumulada no período (47,70%),
descobrimos que o aumento real foi de apenas 12,30%.
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Esses dados nos ajudam a entender
o que houve com algumas das metas da Unifesp para 2012, como por exemplo o
crescimento do número de docentes e Servidores Técnico-administrativos em
Educação (TAE'S) não acompanhar o crescimento do número de estudantes. O dado
mais absurdo é o de número de técnicos, que aumentou somente 8% no período de
2004 a 2011.
Dessa forma, a bandeira histórica dos 10% do PIB para educação pública
já! se mostra necessária e concreta. Para além de uma palavra de ordem, a
conquista dessa reivindicação significaria conquistas concretas para a
educação: uma educação realmente pública, com investimentos adequados em
infraestrutura, permanência estudantil e carreiras docente e de servidores. Só
quem teria a perder com essa conquista seriam banqueiros e donos de escolas e
universidades privadas, que hoje recebem bilhões do governo para aumentarem
seus lucros na lógica privatista do Estado.
Referências
Unifesp –
passado, presente e futuro – FAP (Fundação de Apoio à Unifesp)
Plano de
Desenvolvimento Institucional – 2011-2015 - Unifesp