terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

O X Encontro Nacional Universitário de Diversidade Sexual


Entre os dias 15 e 20 de novembro de 2012 aconteceu na UFRRJ a décima edição do ENUDS (Encontro Nacional Universitário de Diversidade Sexual). O encontro reuniu em torno de 800 participantes, e dezenas de coletivos universitários de diversidade sexual e de luta contra a homofobia de vários estados e universidades do Brasil.
 O encontro surgiu da ideia de se construir um espaço de discussão das questões que giram em torno da diversidade sexual no âmbito da academia e do movimento estudantil. Em 2003, no 49° Congresso da UNE em Goiânia, um grupo de estudantes se mobilizou para aquele que foi chamado de “Ato CONUNE”, que teve como objetivo denunciar a homofobia existente dentro do movimento estudantil. Como resultado dessa articulação, em novembro do mesmo ano foi realizado na cidade de Belo Horizonte o primeiro ENUDS.
A necessidade de se discutir a questão da diversidade sexual na universidade justifica-se pelo papel historicamente jogado por esta instituição na opressão de gênero e de LGBTT’s. Seus saberes hegemonicamente produzidos quase sempre relegaram às sexualidades não normativas um lugar de desvio patológico, que se reproduz também no cotidiano universitário desse público, que enfrenta aparatos institucionais dentro da universidade que muitas vezes os/as ataca brutalmente em sua orientação sexual e sua identidade de gênero.
O movimento estudantil, contudo, também não  apresenta ainda avanços substanciais nesse debate, onde vemos se reproduzir, em muitos espaços de organização e militância, o mesmo machismo, lesbofobia, homofobia e transfobia presentes na sociedade como um todo. O ENUDS, nesse sentido, vem se construindo na perspectiva de fomentar esse debate, estimulando a discussão e a difusão acadêmica de saberes contra-hegemônicos, e potencializando o movimento de diversidade sexual dentro do movimento estudantil. Para isso, a construção e o fortalecimento de coletivos universitários de diversidade sexual nas universidades vem sendo apontado, na trajetória do ENUDS, como um caminho para a efetivação desta luta na universidade.
No X ENUDS o número de coletivos presentes girou em torno da casa de vinte coletivos. O sudeste é a região que mais grupos levou ao encontro, cujo estado de Minas Gerais apareceu articulado em uma rede universitária que aglutina cinco coletivos. O estado de Goiás esteve presente com o grupo Colcha de Retalhos, que se organiza na UFG, e participantes independes de cursos da UFG e outras faculdades do estado.
A décima edição do encontro teve como tema “práticas de resistência e enfrentamento: corpo, política, discurso e poder”, e teve importantes debates em torno da questão da homofobia, da transfobia, da lesbofobia e do machismo, indicando um contexto universitário e social em que as relações ainda são extremamente reprodutoras de opressões diversas, e sinalizando que ainda são imensos os desafios para aqueles a aquelas que lutam por uma universidade que de fato se constitua como espaço justo e livre de opressões.
Contudo, apesar do encontro ser bem politizado, e possibilitar o compartilhamento de saberes e ações realizadas pelos coletivos em seus estados, muitos parecem ser os limites ainda da contribuição dele no fortalecimento da luta da diversidade sexual dentro do movimento estudantil e da sociedade. A disputa política do encontro não é tão intensa, exceto em momentos específicos como a plenária final e os grupos de trabalho que discutem os rumos e perspectivas do próprio encontro.
Os pontos de maior tensão e disputa se concentram nas questões relativas à organização do próximo encontro. Os espaços de compartilhamento de experiência dos coletivos e militantes são ainda muito pouco aproveitados. Nesta última edição um espaço de troca de experiências foi viabilizado, mas ficou limitado a um relato das ações de cada coletivo em seu estado, sem a discussão, questões e troca de sugestões entre os coletivos, que pudesse se dar no sentido de contribuir para o avanço e o fortalecimento desses grupos. Na edição anterior, sequer esse espaço existiu. Os espaços de maior participação continuam a ser as mesas redondas, que infelizmente apresentam-se de forma bastante verticalizada.
Assim, podemos trazer alguns pontos positivos e alguns problemas do encontro que devem ser discutidos. O ENUDS vem se construindo enquanto um espaço riquíssimo de discussão e de contra-hegemonia no espaço opressor da universidade.  Contudo, se a ideia dele é a de fomentar e fortalecer o movimento de diversidade sexual na universidade, no movimento estudantil e na sociedade, parece que existe ainda muito em que se avançar.
As opressões, não apenas contra LGBTT’s, mas contra negras e negros, mulheres, idosos fazem parte da lógica de dominação da sociedade de classes. No capitalismo, o machismo, o preconceito contra LGBTT’s, o racismo atuam segregando e fragmentando a classe trabalhadora, aumentando os efeitos da dominação da burguesia sobre ela. Nesse sentido, a luta consequente dos movimentos de diversidade sexual deve necessariamente pautar a luta contra a lógica desse sistema.
Para isso, é fundamental que a questão da diversidade sexual seja pensada a partir de uma análise profunda das determinações sociais que produzem as normatividades de gênero, orientação sexual, e o preconceito e violência contra as LGBTT’s. Essas determinações tem estreita ligação com a sociedade capitalista, que precisa ser transformada para que condições plenas de liberdade para todas e todos seja realidade.
O ENUDS, ao vir se apresentando ainda muito preso à sua própria estrutura e metodologia, subutilizando espaços horizontais como o da troca de experiências, e minimizando reflexões que articulem diversidade sexual e sociedade de classes, tem se mostrado como um espaço que  ainda tem muitos desafios a enfrentar numa luta consequente pela livre expressão da diversidade sexual.
 Se a ideia dele é a de fomentar e fortalecer o movimento de diversidade sexual na universidade, no movimento estudantil e na sociedade, parece que existe ainda muito em que se avançar. Para que isso possa ser potencializado, o encontro não pode se limitar em si mesmo, deve construir para além, para fora, para o dia a dia da luta em cada estado.   
Nesse sentido, investir nos espaços horizontais como o da troca de experiências, e em um planejamento coletivo de ações e discussões para os grupos em cada estado, respeitando-se, é claro, a especificidade de cada um, talvez fosse um caminho para o fortalecimento desta luta e para o enfrentamento das normatividades sexuais e de gênero na universidade e na sociedade. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Intense Debate Comments