sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Que lições podemos tirar da greve da USP?


Uma mobilização forte

A luta que tivemos esse ano na USP foi a mais forte dos últimos anos e conseguiu coisas que até então eram impensáveis. Muitos cursos que não têm um grande histórico de mobilização entraram com força na luta e alguns fizeram greve pela primeira vez. Vitórias importantes em reivindicações específicas de vários cursos aconteceram, o que já mostra que, apesar da postura truculenta e repressora da reitoria e do governo e de sua indisposição em dialogar, a luta é o caminho para mudanças.
Outro elemento muito importante foi uma ocupação que foi feita com o movimento unificado e que conseguiu ganhar legitimidade não apenas dentro do movimento, mas em alguns setores da sociedade. Seguidas vitórias políticas que tivemos na justiça contra a reintegração de posse mostram a força da legitimidade e da ação unificada do movimento, uma vez que, como sabemos de experiências anteriores, o judiciário é um campo favorável aos adversários das mobilizações. E a força se expressou também na relação direta entre o movimento e a reitoria. Primeiro obrigamos o reitor a sentar para negociar com o movimento, o que há muito tempo não acontecia. Depois arrancamos da reitoria um termo de acordo com muitos pontos importantes, que mostrou o poder do movimento e o medo do Governo do Estado de que expandíssemos nossa mobilização. Naquele documento, um ponto fundamental faltava para que tivéssemos uma vitória consolidada: a garantia de não punição.

Um debate político contra a divisão do movimento

 A partir do momento em que foi proposto o termo, o movimento, que ainda poderia ter mais um fôlego, tendeu a se dividir e enfraquecer. É importante frisar a diferença entre divisão do movimento e divergências políticas. As divergências e votações não só devem ter espaço, como são fundamentais para que o movimento avance, aprenda e chegue a novas sínteses. Porém, quando as divergências deixam de ser discutidas em suas raízes e passam a ser debatidas em linhas gerais, os debates vão se despolitizando e avançar a partir deles fica cada vez mais difícil. Quando votamos, por exemplo, que não debateríamos ponto por ponto do documento e que somente aceitaríamos ou rejeitaríamos o termo por inteiro demos um passo nesse sentido. As disputas em linhas gerais entre dois grandes blocos – sem possibilidades de pequenos adendos que levariam o debate a um nível superior – acabam colocando as disputas em um nível mais moral que político. Quando isso começou a acontecer nessa mobilização, passamos a nos enfraquecer.
Uma lição que fica a partir disso é que é importante aprofundar o debate político sobre as bandeiras não só no início, mas ao longo da mobilização. Isso ajuda a evitar a divisão do movimento em posições tomadas superficialmente e, portanto, menos politizadas.

O ME da USP precisa se dispor a se articular de fato com os outros movimentos sociais

A reitoria, após entregar o termo, provavelmente por achar que com ele dividiria e enfraqueceria o movimento, se recusou a continuar negociando. Nesse momento, vários setores do movimento corretamente viram a necessidade de mais radicalização para aumentar nossa pressão. Porém, nenhuma ação mais radicalizada podia dar resposta ao movimento. O ME já estava usando uma das estratégias de pressão mais eficientes, que é a ocupação. Maior força só poderia ser conseguida se saíssemos do âmbito dos estudantes e da universidade e se construíssemos nosso movimento junto com outros movimentos sociais de trabalhadores. Essa unificação poderia multiplicar nossa força, e faria o Governo Estadual temer muito mais nossa mobilização.

Mas o que é construir conjuntamente com outros movimentos sociais?

Alguns apoios pontuais, ações conjuntas e diálogos entre diferentes setores da sociedade são muito importantes, como chamar determinados movimentos sociais para debates na universidade, fazer campanhas do ME em lugares fora da universidade, debater entre os estudantes lutas de outras categorias ou ter alguma ação conjunta com estas. Porém, apesar de importantes, essas ações são bastante efêmeras e não configuram de fato uma construção conjunta. O ME da USP pode tomar iniciativas mais sólidas no sentido de se unificar com diversos outros movimentos. Para a construção conjunta de lutas, é importante que haja espaços de articulação, onde se debatam as pautas comuns e as ações a serem tocadas conjuntamente. Um encontro dos movimentos de São Paulo que debatesse o combate à repressão e o acesso à educação e ao transporte poderia ser articulado e fortaleceria não só o ME, mas todos aqueles que, como nós, se enfrentam com os governos. No ano de 2014, essa articulação será ainda mais necessária, pois todos os movimentos estarão combatendo ataques parecidos, em função da Copa. Um fórum dos movimentos em São Paulo teria um papel importante na articulação das lutas até nacionalmente
       Para lutarmos por cotas, por democratização real da universidade e contra a violência do estado que sofremos é fundamental que estejamos junto ao movimento negro, aos cursinhos populares, movimentos da periferia e de tod@s aqueles que lutam por direitos!

As mobilizações ainda esse ano

A greve desse ano foi muito forte, conseguiu várias vitórias particulares em alguns cursos e teve chances de conseguir outras importantes para toda a USP. Porém, na prática, já terminou e quase todos os cursos estão tendo aulas normalmente. A grande vitória que tivemos esse ano foi construir um movimento que deixaria um legado positivo para futuras mobilizações. Os avanços políticos e a força que tivemos nos deram moral para continuar reivindicando e lutando. Porém, uma greve votada em assembleia geral que não acontece na prática tem efeito contrário: desmoraliza o movimento e tende a dificultar que as pessoas queiram embarcar em novas lutas. É importante que, no momento em que estamos, quando a greve, de fato, já não existe e não existem condições objetivas para reerguê-la, a encerremos formalmente e tracemos, sobre a base da nossa força atual, os rumos de novas lutas para o próximo ano.

E a consulta para Reitor?

Porém, uma última campanha ainda é necessária esse ano,quando acontecerá uma consulta de opinião para reitor. Essaconsulta não terá valor oficial na eleição do novo dirigente daUSP e servirá apenas para a burocracia legitimar uma dasquatro candidaturas apresentadas, todas marcadamentecontrárias ao movimento e às nossas reivindicações, assimcomo é atualmente o reitorado de Rodas. Não queremosparticipar de um processo que tem esse intuito. Dizem quequerem ouvir nossa opinião, mas não há opção favorável paranós. O movimento da USP não deve votar nessa consulta,dando continuidade à importante luta que fizemos contra essesistema muito antidemocrático de eleições para Reitor.

Em 2014: uma calourada para continuar junho e outubro!

A calourada de 2014 precisa cumprir um papel de preparar os estudantes para as grandes lutas que devem acontecer esse ano, dentro efora da USP. Colocar a necessidade de conquistarmos os blocos K e L do CRUSP, avançarmos na democratização da universidade e, além disso, termos parte nas grandes lutas que sucederão junho. Mas não apenas preparar individualmente cada pessoa com bons debates. A calourada deve ajudar a apontar para a necessidade de o nosso movimento se articular mais solidamente com outros e já trazer representantes de diversos setores das lutas para dialogar com os novos estudantes da Universidade.


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quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Há muito além dos dois grandes blocos que aparecem no ME da USP – como chegar a uma síntese para avançar nas lutas?

A divisão do ME da USP em dois blocos que pouco dialogam entre si não é natural. As questões são bastante mais complexas que essa divisão e precisam ser analisadas de forma mais global. Assim como as respostas que o movimento precisa não virão através de uma polarização que não avança para nenhum tipo de síntese.
O ME da USP já teve vitórias suficientes e deve sair da greve e da ocupação? Ou ainda não conseguiu nada daquilo que reivindicava e precisa continuar na mobilização lutando para que as pautas iniciais sejam alcançadas?
Discursos derrotistas que não reconhecem os nossos avanços trazem acúmulo negativo para o movimento. Por outro lado não podemos afirmar que tivemos vitórias em todas as pautas. Não atingimos objetivos centrais, como as eleições diretas para reitor, mas vemos no congresso a oportunidade de pressionarmos novamente a burocracia universitária, com um movimento ainda mais forte, influenciado pelos avanços que estamos conquistando para obter essas vitórias. É importante analisarmos essas contradições mais detalhadamente antes de decidirmos sair ou não da greve, e em quais condições.
O movimento tem vitórias?
Antes de tudo, é importante uma análise precisa do momento em que estamos. O documento do acordo proposto pela reitoria traz alguns avanços concretos para o ME. Propuseram sobre pontos que constavam em nossa pauta e também sobre assuntos que são reivindicações históricas, mas que não apareceram entre os eixos atuais. Não pode haver dúvidas de que o simples fato de a reitoria sentar para negociar já é em si uma vitória, visto que isso não acontecia antes. Se fosse apenas isso, seria uma vitória pequena, que se referiria apenas ao reconhecimento da legitimidade que o movimento impôs à reitoria.
Mas conseguimos alguns pontos a mais, não somente a negociação. Conseguimos um Congresso, que não é aquele que queríamos, mas também não é aquele que a reitoria queria. Conseguimos um instrumento de união com o movimento dos funcionários através da vinculação do aumento das bolsas. Conseguimos promessas de reaver os blocos perdidos da moradia e de não demolição do NCN. E vários outros pontos que historicamente a reitoria se negava a conceder. Não tivemos a conquista completa dos eixos principais, mas não é verdade dizer que não tivemos vitórias.
É bastante provável que a reitoria, se aceitarmos o termo proposto, volte atrás e tente não cumpri-lo, ou imponha uma interpretação distorcida do acordo para que não precise se comprometer com alguns dos pontos. Isso, porém, é uma contingência do próprio momento em que estamos das lutas: a garantia não se dará de outra forma senão através da nossa aceitação do termo e da continuidade da mobilização posteriormente para cobrar o cumprimento. O fato de a reitoria poder não cumprir o prometido não tira o mérito das vitórias. Porém, o fato de termos vitórias não é tudo.
Qual o saldo que essa mobilização pode deixar?
Para conseguirmos cobrar o cumprimento dos pontos do termo e ainda avançar para mais conquistas, é importante termos força para, por exemplo, fazer um movimento da mesma magnitude ou maior que o que tivemos esse ano. A própria questão de a estatuinte ser ou não soberana vai depender, mais do que do acordo atual, da mobilização que tivermos no próximo ano, durante o CO que pode decidir sobre o novo estatuto. Ela é quem vai determinar se é o estatuto da comunidade USP ou se o do CO vai valer. Há alguns elementos que contribuem para aumentarmos essa força nas próximas mobilizações, outros que jogam contra.
Uma lista de vitórias importantes do movimento, ainda que não dos eixos centrais, ajuda a mostrar que a luta é efetiva e a combater os setores que são contra a mobilização. A lista de concessões proposta pela reitoria já ajudou o debate nesse sentido em muitos lugares e pode cumprir esse papel de mostrar que tivemos, sim, vitórias.
Por outro lado, punições dos envolvidos com a ocupação, assim como uma reintegração de posse violenta nessa altura das coisas, seria um fato que nos desmoralizaria e ajudaria o Rodas a se colocar no lugar a que foi chamado: de destruir o ME sem fazer concessões.
Como a reitoria joga
Nosso reitor conhece de alguma forma a dinâmica do movimento e foi colocado no cargo que hoje ocupa centralmente para pensar em como nos desarticular e destruir. Ele pensa muito bem em cada movimento que faz junto a nós. Apesar de nossa mobilização ter sido muito forte e em muitos momentos ter deixado a reitoria completamente perdida e sem saber o que fazer (como foi bem claro quando pediram a desocupação da torre do relógio), eles continuaram tentando nos derrotar mesmo depois que conseguimos alguns avanços.
Houve três movimentos coordenados da reitoria, que o movimento não percebeu com clareza.
Um deles foi fazer uma lista de propostas de concessão que dividiria o movimento. A reitoria tenta dividir os dois setores que em 2011 estavam separados e que, por isso, permitiram que o choque entrasse aqui para uma reintegração de posse extremamente violenta. Para isso, fez uma lista de propostas muito boas, juntando reivindicações atuais parcialmente atendidas com reivindicações históricas, ao mesmo tempo em que se esquivou de tomar posição sobre pautas centrais, que foram a da repressão e da soberania da estatuinte. Claramente isso poderia dividir o movimento.
Os outros dois movimentos foram: ao mesmo tempo em que fez a proposta colocada, voltou a negar qualquer negociação; e pediu novamente a reintegração de posse do prédio ocupado. A divisão do movimento e uma reintegração violenta podem fazer com que as vitórias tenham um peso menor ou até retrocedam.
Portanto, é central que nesse momento nós combatamos essa divisão em dois grupos antagônicos, e que dialoguemos de forma a avançarmos juntos para consolidar as conquistas que temos. A luta política é um local em que a legitimidade e a moral de cada lado perante o senso comum pode valer mais do que a quantidade ou o tamanho dos avanços sobre o adversário. Em um jogo de futebol fazer o último gol, no final do jogo, dá algum moral ao time, mesmo que esteja perdendo. Na nossa disputa com o Rodas, não podemos dar a ele a vantagem de fazer um gol aos 45 do segundo tempo.
Como consolidar as conquistas?
Estamos em um momento difícil. Ao mesmo tempo em que temos uma vitória suficientemente grande para sairmos da greve e da ocupação, há ainda um ponto que não foi atendido, sem o qual o movimento corre um grande risco de perder muito no próximo período e de não ter tanta força nas próximas mobilizações: a pauta das punições. Quando uma greve está completamente capenga e sem força, não temos opção senão encerrarmos o movimento sem garantias de não punição. Não é o caso atual.
A mobilização em que estamos arrancou concessões antes quase impensáveis da reitoria e, apesar de muitos cursos terem saído da greve, a mobilização continua, assim como o apoio às ações do movimento. A fraqueza terminal não é um motivo para não brigarmos pela garantia de não punição. Sair da greve e da ocupação com a o termo atual assinado e com um termo de não punição seria hoje o único movimento que poderia fortalecer uma promessa de voltarmos no próximo ano.
Ora, mas com o movimento dividido entre dois lados – um que ignora as conquistas que tivemos e outro que ignora a importância de um termo de não punição para a continuidade das lutas – não conseguiremos avançar para esse ponto necessário. Além disso, a própria divisão do movimento nessa disputa sem diálogo e sem disposição para chegar a uma síntese ajuda na desmoralização de toda a nossa luta.
Devemos, nesse momento crucial, mostrar à reitoria que estamos juntos e, garantindo o termo já proposto, condicionar a saída da greve e da ocupação à garantia da não punição.

· Consolidar as conquistas já obtidas pelo movimento para podermos avançar! Preparar uma mobilização no próximo ano para obrigar a reitoria a reconhecer a estatuinte da comunidade USP como soberana!
· Unificar o movimento e continuar a mobilização até que a reitoria garanta a não punição dos lutadores!

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

País de uma Nota só!

Na noite de 4 de Novembro de 1969, há 44 anos atrás, os agentes da ditadura assassinavam Marighella. Carlos Marighella foi um importante militante comunista que lutava pela classe trabalhadora e chegou a ser uma das principais figuras da resistência à ditadura, chegando a ser inimigo número um do regime.

Em homenagem a este grande lutador trazemos um poema de sua autoria.

País de uma Nota Só

Não pretendo nada,
nem flores, louvores, triunfos.
nada de nada.

Somente um protesto,
uma brecha no muro,
e fazer ecoar,
com voz surda que seja,
e sem outro valor,
o que se esconde no peito,
no fundo da alma
de milhões de sufocados.
Algo por onde possa filtrar o pensamento,
a idéia que puseram no cárcere.

A passagem subiu,
o leite acabou,
a criança morreu,
a carne sumiu,
o IPM prendeu,
o DOPS torturou,
o deputado cedeu,
a linha dura vetou,
a censura proibiu,
o governo entregou,
o desemprego cresceu,
a carestia aumentou,
o Nordeste encolheu,
o país resvalou.

Tudo dó,
tudo dó,
tudo dó...

E em todo o país
repercute o tom
de uma nota só...
de uma nota só... 

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