A divisão do ME da USP em dois blocos que pouco dialogam entre si não é
natural. As questões são bastante mais complexas que essa divisão e precisam
ser analisadas de forma mais global. Assim como as respostas que o movimento
precisa não virão através de uma polarização que não avança para nenhum tipo de
síntese.
O ME da USP já teve vitórias suficientes e deve sair da greve e da
ocupação? Ou ainda não conseguiu nada daquilo que reivindicava e precisa
continuar na mobilização lutando para que as pautas iniciais sejam alcançadas?
Discursos derrotistas que não reconhecem os nossos avanços trazem
acúmulo negativo para o movimento. Por outro lado não podemos afirmar que
tivemos vitórias em todas as pautas. Não atingimos objetivos centrais, como as
eleições diretas para reitor, mas vemos no congresso a oportunidade de pressionarmos
novamente a burocracia universitária, com um movimento ainda mais forte,
influenciado pelos avanços que estamos conquistando para obter essas vitórias.
É importante analisarmos essas contradições mais detalhadamente antes de
decidirmos sair ou não da greve, e em quais condições.
O
movimento tem vitórias?
Antes de tudo, é importante uma análise precisa do momento em que
estamos. O documento do acordo proposto pela reitoria traz alguns avanços
concretos para o ME. Propuseram sobre pontos que constavam em nossa pauta e
também sobre assuntos que são reivindicações históricas, mas que não apareceram
entre os eixos atuais. Não pode haver dúvidas de que o simples fato de a
reitoria sentar para negociar já é em si uma vitória, visto que isso não
acontecia antes. Se fosse apenas isso, seria uma vitória pequena, que se
referiria apenas ao reconhecimento da legitimidade que o movimento impôs à
reitoria.
Mas conseguimos alguns pontos a mais, não somente a negociação.
Conseguimos um Congresso, que não é aquele que queríamos, mas também não é
aquele que a reitoria queria. Conseguimos um instrumento de união com o
movimento dos funcionários através da vinculação do aumento das bolsas.
Conseguimos promessas de reaver os blocos perdidos da moradia e de não demolição
do NCN. E vários outros pontos que historicamente a reitoria se negava a
conceder. Não tivemos a conquista completa dos eixos principais, mas não é
verdade dizer que não tivemos vitórias.
É bastante provável que a reitoria, se aceitarmos o termo proposto,
volte atrás e tente não cumpri-lo, ou imponha uma interpretação distorcida do
acordo para que não precise se comprometer com alguns dos pontos. Isso, porém,
é uma contingência do próprio momento em que estamos das lutas: a garantia não
se dará de outra forma senão através da nossa aceitação do termo e da
continuidade da mobilização posteriormente para cobrar o cumprimento. O fato de
a reitoria poder não cumprir o prometido não tira o mérito das vitórias. Porém,
o fato de termos vitórias não é tudo.
Qual
o saldo que essa mobilização pode deixar?
Para conseguirmos cobrar o cumprimento dos pontos do termo e ainda
avançar para mais conquistas, é importante termos força para, por exemplo,
fazer um movimento da mesma magnitude ou maior que o que tivemos esse ano. A
própria questão de a estatuinte ser ou não soberana vai depender, mais do que
do acordo atual, da mobilização que tivermos no próximo ano, durante o CO que
pode decidir sobre o novo estatuto. Ela é quem vai determinar se é o estatuto
da comunidade USP ou se o do CO vai valer. Há alguns elementos que contribuem
para aumentarmos essa força nas próximas mobilizações, outros que jogam contra.
Uma lista de vitórias importantes do movimento, ainda que não dos eixos
centrais, ajuda a mostrar que a luta é efetiva e a combater os setores que são
contra a mobilização. A lista de concessões proposta pela reitoria já ajudou o
debate nesse sentido em muitos lugares e pode cumprir esse papel de mostrar que
tivemos, sim, vitórias.
Por outro lado, punições dos envolvidos com a ocupação, assim como uma
reintegração de posse violenta nessa altura das coisas, seria um fato que nos
desmoralizaria e ajudaria o Rodas a se colocar no lugar a que foi chamado: de
destruir o ME sem fazer concessões.
Como
a reitoria joga
Nosso reitor conhece de alguma forma a dinâmica do movimento e foi
colocado no cargo que hoje ocupa centralmente para pensar em como nos
desarticular e destruir. Ele pensa muito bem em cada movimento que faz junto a
nós. Apesar de nossa mobilização ter sido muito forte e em muitos momentos ter
deixado a reitoria completamente perdida e sem saber o que fazer (como foi bem
claro quando pediram a desocupação da torre do relógio), eles continuaram
tentando nos derrotar mesmo depois que conseguimos alguns avanços.
Houve três movimentos coordenados da reitoria, que o movimento não
percebeu com clareza.
Um deles foi fazer uma lista de propostas de concessão que dividiria o
movimento. A reitoria tenta dividir os dois setores que em 2011 estavam
separados e que, por isso, permitiram que o choque entrasse aqui para uma
reintegração de posse extremamente violenta. Para isso, fez uma lista de
propostas muito boas, juntando reivindicações atuais parcialmente atendidas com
reivindicações históricas, ao mesmo tempo em que se esquivou de tomar posição
sobre pautas centrais, que foram a da repressão e da soberania da estatuinte.
Claramente isso poderia dividir o movimento.
Os outros dois movimentos foram: ao mesmo tempo em que fez a proposta
colocada, voltou a negar qualquer negociação; e pediu novamente a reintegração
de posse do prédio ocupado. A divisão do movimento e uma reintegração violenta
podem fazer com que as vitórias tenham um peso menor ou até retrocedam.
Portanto, é central que nesse momento nós combatamos essa divisão em dois
grupos antagônicos, e que dialoguemos de forma a avançarmos juntos para
consolidar as conquistas que temos. A luta política é um local em que a
legitimidade e a moral de cada lado perante o senso comum pode valer mais do
que a quantidade ou o tamanho dos avanços sobre o adversário. Em um jogo de
futebol fazer o último gol, no final do jogo, dá algum moral ao time, mesmo que
esteja perdendo. Na nossa disputa com o Rodas, não podemos dar a ele a vantagem
de fazer um gol aos 45 do segundo tempo.
Como
consolidar as conquistas?
Estamos em um momento difícil. Ao mesmo tempo em que temos uma vitória
suficientemente grande para sairmos da greve e da ocupação, há ainda um ponto
que não foi atendido, sem o qual o movimento corre um grande risco de perder
muito no próximo período e de não ter tanta força nas próximas mobilizações: a
pauta das punições. Quando uma greve está completamente capenga e sem força,
não temos opção senão encerrarmos o movimento sem garantias de não punição. Não
é o caso atual.
A mobilização em que estamos arrancou concessões antes quase impensáveis
da reitoria e, apesar de muitos cursos terem saído da greve, a mobilização
continua, assim como o apoio às ações do movimento. A fraqueza terminal não é
um motivo para não brigarmos pela garantia de não punição. Sair da greve e da
ocupação com a o termo atual assinado e com um termo de não punição seria hoje
o único movimento que poderia fortalecer uma promessa de voltarmos no próximo
ano.
Ora, mas com o movimento dividido entre dois lados – um que ignora as
conquistas que tivemos e outro que ignora a importância de um termo de não
punição para a continuidade das lutas – não conseguiremos avançar para esse
ponto necessário. Além disso, a própria divisão do movimento nessa disputa sem
diálogo e sem disposição para chegar a uma síntese ajuda na desmoralização de
toda a nossa luta.
Devemos, nesse momento crucial, mostrar à reitoria que estamos juntos e,
garantindo o termo já proposto, condicionar a saída da greve e da ocupação à
garantia da não punição.
· Consolidar as conquistas já obtidas
pelo movimento para podermos avançar! Preparar uma mobilização no próximo ano
para obrigar a reitoria a reconhecer a estatuinte da comunidade USP como
soberana!
· Unificar o movimento e continuar a
mobilização até que a reitoria garanta a não punição dos lutadores!
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